RESPONSABILIDADE PENAL MILITAR NA ANTÁRTIDA: UM OLHAR SOBRE O CASO DE CRIMES SEXUAIS NA ESTAÇÃO COMANDANTE FERRAZ

Introdução

O recente veredicto proferido pelo Superior Tribunal Militar (STM) em relação a um caso de crimes sexuais envolvendo dois militares da Marinha do Brasil na Estação Antártica Comandante Ferraz (EACF) despertou a atenção para a competência da Justiça Militar Brasileira e suas ramificações extraterritoriais. Neste artigo, exploraremos os fundamentos jurídicos que embasam a jurisdição militar nesse contexto peculiar e analisaremos a importância da decisão do STM.

A Competência da Justiça Militar Brasileira

A base do poder de julgamento da Justiça Militar Brasileira nesse caso reside na interseção do Tratado da Antártida com o Código Penal Militar. O Tratado da Antártida, firmado em 1959 e ao qual o Brasil aderiu em 1975, estabelece um compromisso internacional de cooperação científica no continente antártico. A criação do Programa Antártico Brasileiro (PROANTAR) e da EACF demonstra o comprometimento do Brasil com a exploração científica e a preservação desse ambiente.

O Código Penal Militar, por sua vez, define a competência da Justiça Militar da União para julgar crimes militares, especialmente quando cometidos em lugar sujeito à administração militar. O contexto específico da EACF, sob a administração militar brasileira, enquadra-se nessa definição, permitindo que a Justiça Militar da União apure e julgue os crimes ocorridos na base.

A Circunscrição da Justiça Militar da União

A Auditoria Militar de Brasília, como a circunscrição judiciária militar responsável por casos ocorridos fora do território nacional, foi o palco para o julgamento de primeira instância dos dois acusados. Este caso evidencia a complexidade de delinear a jurisdição territorial da Justiça Militar da União, especialmente em situações únicas como a Antártida, onde as fronteiras convencionais não se aplicam diretamente.

O Recurso ao Superior Tribunal Militar e as Penas Aplicadas

O Ministério Público Militar desempenhou um papel crucial ao recorrer ao STM após a absolvição dos acusados em primeira instância. A decisão do STM de condenar a dupla em segunda instância reafirma a seriedade da Justiça Militar Brasileira na apuração e julgamento de crimes, mesmo em contextos tão desafiadores.

O oficial foi considerado culpado por ato libidinoso em área militar e recebeu uma pena de um ano de detenção, convertida em prisão. Já o praça foi condenado por atentado violento ao pudor, com uma pena de dois anos e oito meses de reclusão, além da expulsão das Forças Armadas.

Conclusão

O caso de crimes sexuais na Estação Comandante Ferraz reforça a importância da jurisdição militar em contextos extraterritoriais, especialmente quando ligados a atividades científicas e de cooperação internacional. A decisão do STM destaca o compromisso do Brasil com a justiça e a responsabilidade penal, independentemente da localização geográfica dos crimes. Diante desse cenário, é imperativo que as instituições jurídicas brasileiras continuem aprimorando e atualizando suas práticas para garantir a justiça em todos os âmbitos, incluindo o desafiador território antártico.

Flávio Milhomem
Flávio Milhomem

Promotor de Justiça do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), Mestre em Ciências Jurídico-Criminais pela Universidade Católica Portuguesa, Especialista em Combate à Corrupção (Magistrado Associado) pela Escola Nacional da Magistratura Francesa (ENM/France).