AS INOVAÇÕES LEGISLATIVAS
No dia 04 de abril, foram publicadas leis importantes para a garantia dos direitos das mulheres na aplicação da justiça. A Lei nº 14.540/23, instituiu o Programa de Prevenção e Enfrentamento ao Assédio Sexual e demais Crimes contra a Dignidade Sexual e à Violência Sexual no âmbito da administração pública, direta e indireta, federal, estadual, distrital e municipal. A Lei nº 14.541/23 dispõe sobre a criação e o funcionamento ininterrupto de Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher, reconhecendo a importância de um atendimento diferenciado e qualificado para as mulheres vítimas de violência. Já a Lei Nº 14.542/23 altera a Lei nº 13.667/18, para garantir a prioridade no atendimento às mulheres em situação de violência doméstica e familiar pelo Sistema Nacional de Emprego (Sine), reconhecendo a importância da promoção da autonomia econômica das mulheres como um meio de enfrentamento à violência de gênero. Essas medidas mostram-se fundamentais para a promoção da igualdade de gênero e para a proteção das mulheres contra a violência e a discriminação de que ainda são alvo em nossa sociedade.
A JUSTIÇA CRIMINAL SOB PERSPECTIVA DE GÊNERO
As alterações legislativas vão ao encontro da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça que tem trazido importantes avanços no que diz respeito à realização da justiça sob a perspectiva de gênero. Dentre os precedentes que merecem destaque, podemos citar a Súmula n. 600/STJ, que estabelece que para a configuração da violência doméstica e familiar prevista na Lei Maria da Penha não é necessário que autor e vítima coabitem juntos.
INICIATIVA PARA A RESPONSABILIZAÇÃO PENAL DO AGRESSOR
Além disso, a Súmula n. 542/STJ deixa claro que a ação penal relativa ao crime de lesão corporal resultante de violência doméstica contra a mulher é pública incondicionada. Ou seja, a denúncia pode ser feita pelo Ministério Público mesmo sem a autorização da vítima.
INAPLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA
Outra importante súmula é a n. 589/STJ, que declara a inaplicabilidade do princípio da insignificância nos crimes ou contravenções penais praticados contra a mulher no âmbito das relações domésticas. Cuida-se de precedente qualificado extremamente importante, pois é comum que agressões e ameaças menores sejam minimizadas, quando na verdade representam um padrão de violência que pode culminar em agressões mais graves.
IMPOSSIBILIDADE DE SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE
A Súmula n. 588/STJ estabelece que a prática de crime ou contravenção penal contra a mulher com violência ou grave ameaça no ambiente doméstico impossibilita a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos. Essa decisão é importante para garantir que agressores sejam efetivamente punidos pelos crimes cometidos.
SURSIS PROCESSUAL E TRANSAÇÃO PENAL
O STJ também estabeleceu que a suspensão condicional do processo e a transação penal não se aplicam na hipótese de delitos sujeitos ao rito da Lei Maria da Penha (Súmula n. 536/STJ). Dessa forma, a Lei Maria da Penha ganha mais força para proteger as mulheres que sofrem violência doméstica.
PRESUNÇÃO DE VULNERABILIDADE DA MULHER
Outra decisão importante é a que reconhece a vulnerabilidade, hipossuficiência ou fragilidade da mulher como presumidas nas circunstâncias descritas na Lei n. 11.340/2006, a Lei Maria da Penha. Além disso, as medidas protetivas previstas na Lei n. 11.340/2006 são aplicáveis às minorias, como transexuais, transgêneros, cisgêneros e travestis em situação de violência doméstica, afastado o aspecto meramente biológico.
PROTEÇÃO DA IMAGEM DA MULHER
A exposição pornográfica de imagem, sem o consentimento da vítima, viola os direitos da personalidade com propensão a configurar grave forma de violência de gênero (Súmula n. 618/STJ).
BENEFÍCIOS NA EXECUÇÃO DA PENA
Outras decisões também avançam na proteção das mulheres, como a possibilidade de concessão de prisão domiciliar para presas gestantes ou mães de menor ou de pessoa com deficiência, durante a execução provisória ou definitiva da pena. A concessão de prisão domiciliar à mulher com filho de até 12 anos incompletos não está condicionada à comprovação da imprescindibilidade de cuidados maternos, que é legalmente presumida.
OUTRAS CONQUISTAS
O STJ também reconheceu que a pessoa transgênero tem direito fundamental subjetivo à alteração de seu prenome e de sua classificação de gênero no registro civil independentemente da realização de cirurgia de transgenitalização.
Além disso, há decisões que tratam de outras questões importantes, como a possibilidade de remarcação de cursos de formação ou testes de aptidão física em concursos públicos para candidatas gestantes ou lactantes, a responsabilidade objetiva de laboratórios por danos morais no resultado falso negativo de exames de DNA para investigação de paternidade, e a responsabilização civil de laboratórios que distribuem medicamentos anticoncepcionais ineficazes.
Em resumo, as alterações legislativas e o avanço da jurisprudência sob a perspectiva de gênero representam importantes conquistas para a proteção dos direitos das mulheres e minorias em situação de vulnerabilidade. Cabe aos operadores do direito garantir a efetiva aplicação dessas decisões e buscar cada vez mais a proteção e promoção dos direitos humanos das mulheres.