PÂNICO MORAL
No livro “Sentenciando o tráfico” (Tirant Lo Blanch Brasil, 2019), Marcelo Semer, Desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo, aborda o papel dos juízes, da imprensa e dos mecanismos judiciais frente ao tráfico de drogas no Brasil. Ele introduz o conceito de “pânico moral”, formulado por Stanley Cohen, no qual a mídia intensifica a percepção de medo e insegurança social, posicionando o crime como uma ameaça iminente à sociedade. Este estado de pânico, potencializado pela mídia, propaga o populismo penal, influenciando políticas e decisões judiciais.
No debate sobre drogas, esse pânico é ainda mais proeminente, com a figura do “traficante” frequentemente estereotipada como vilão social. A postura predominantemente punitiva dos juízes diante do tráfico de drogas no Brasil é intensificada pelo legado autoritário do país, o que muitas vezes perpetua desigualdades sociais.
DISTINÇÃO TRAFICANTE/USUÁRIO
A discussão sobre a influência do pânico moral na sociedade e no sistema de justiça criminal se mostra especialmente relevante quando se constata que a Lei 11.343/2006 define penalidades para envolvidos no tráfico, mas a linha entre usuário e traficante mostra-se ambígua. Muitas vezes, o rótulo de “traficante” é atribuído independentemente da quantidade de droga em posse do suspeito.
DESCRIMINALIZAÇÃO DO PORTE DE DROGAS PARA CONSUMO PESSOAL
Sobre a descriminalização do porte de drogas para consumo pessoal no país, durante o julgamento do Recurso Extraordinário RE 635659/STF, o Ministro Gilmar Mendes enfatizou a necessidade de transitar a questão das drogas do campo penal para o da saúde pública.
Mendes argumenta que penalizar a posse de drogas para consumo pessoal vai contra o direito ao desenvolvimento livre da personalidade. A abordagem penal, ele sugere, é desproporcional, especialmente quando o risco é majoritariamente ao usuário.
CRITÉRIO OBJETIVO
No mesmo julgamento, o Ministro Alexandre de Moraes propôs critérios específicos para a maconha, visando distinguir usuários de traficantes e promover a isonomia. Ele sugere que indivíduos portando entre 25g e 60g de maconha ou até seis plantas fêmeas sejam classificados como usuários.
O julgamento está em pausa após pedido de vista do Ministro André Mendonça. Até agora, cinco votos são contrários à criminalização da posse de maconha para consumo próprio.
CONCLUSÃO
O debate sobre a descriminalização das drogas no Brasil é multifacetado e profundamente enraizado em contextos sociais, históricos e judiciais. O julgamento do RE 635659/STF marca um momento crucial neste debate, trazendo à tona a necessidade de distinguir claramente entre usuários e traficantes e de reconsiderar a abordagem penal em relação ao consumo de drogas. A perspectiva de transição da questão das drogas do campo penal para o da saúde pública sugere um caminho mais humanizado e alinhado com os direitos fundamentais garantidos pela Constituição Brasileira. A continuidade do julgamento é aguardada com grande expectativa, pois poderá definir novos rumos para a política de drogas no Brasil, com possíveis reflexos em diversas esferas da sociedade.